sábado, 1 de março de 2008

Uma Amanda

Amanda despedaçava seus sonhos, involuntariamente. Buscava a cada dia renovar seu arquivo de tranqüilidade, mas tornava-se cada vez mais atormentada. Queria distingüir realidade e fantasia, mas tudo era distorcido aos seus olhos.
Agora Amanda sangrava, definhava; suas mãos não obedeciam os comandos de seu cérebro. Amanda estava morrendo, mas sem sentir seus pulsos doloridos, e enojadamente, sentia sua alma caindo num abismo, gritando por socorro. Ela não fora capaz de se salvar.
Olhou ao redor, o que via era a negra penumbra do quarto e seu sangue escorrendo pelo chão limpo.
"Daqui a umas horas serei apenas mais um corpo no necrotério, na sala de autópsias."
Há muito tempo, Amanda pedira paz, hasteara a bandeira branca, mas a verocidade da sua morte gritara mais alto.
Amanda fechou os olhos e adormeceu.
Mesmo de olhos fechados, via fantasmas ao seu redor, dizendo que todo o feito fora em vão, ali ela estava mais perdida. As saídas não existiam, e um labirinto começou a formar-se na mente da pobre e inocente jovem Amanda.

Quando abriu os olhos, sobressaltada, uma mão pousou leve em sua testa. "Descansa!". Ouviu um sussurro. Olhou para o teto, mas a claridade a impedia de enxergar qualquer coisa. Fechou os olhos, duvidando de sua vida e também do paraíso.

Foram horas seguidas de total confusão entre o sonho da vida e sono da morte.
Amanda sentia a mão que pousara em sua testa sobre sua mão, tão pequena e fria, enquanto a outra tão calorosa lhe passava a sensação de um abrigo seguro.
Sua respiração ficava cada vez mais difícil, os tubos no nariz e na boca incomodavam-na. "Que ótimo! Eu não morri!" - ironizou em pensamento -. Alguém lutara pela vida de Amanda, mas não existia motivo algum para este feito. Ela queria, verdadeiramente, deixar a vida. E aquilo a fez sentir uma repulsa ainda maior.

Dois meses após a saída de Amanda do hospital (com uma bela história pra contar não sabia pra quem), o médico gentil que ficara velando dia e noite por ela vai até sua casa para visitar-lhe, mas a encontra deitada no chão, a cabeça envolta de uma poça de seu próprio sangue, os olhinhos castanhos ainda abertos, despida, um bilhete na mão e um revólver na outra.

"Faço minhas tuas palavras

Estou despida por que me masturbei pela última vez em minha vida, se a morte é prazerosa pra quem a tira, gostaria de sentir dois prazeres, um após o outro. Tudo o mais é superficial e ingênuo. A bala que está dentro de minha cabeça agora percorreu todo o meu corpo. 'Não se assuste com a morte, pois a vida trás consigo conseqüências bem piores, inclusive o suicídio...' Foi isso que ouvi de tua boca.
Perdoe-me pelo tempo que o fiz perder em cuidar de mim, mas não quero viver mais um segundo. A ausência da vida é melhor que a solidão em que me encontrava."

3 comentários:

Barbie Destrossada(sic) disse...

Algumas pessoas andam por ruas mal iluminadas,enquanto outras escolhem os becos(de preferência os sem saída).
Becos estes com teto anti-fuga,chão áspero e paredes bastantes sólidas com poucas(ou nenhuma) frestas de ar e iluminação.
São os casos sem solução.

Sofia O. disse...

É, Barbie... E prejudicam-se, veemente.

Marília disse...

Sophia, Sophia...
Não tem igual meeeesmo!

\o\ Reverências!